Direita critica verborragia de Guedes, mas não liga para fala sobre empregadas
Brasilpor Fábio Zanini | Folhapress
Grande parte da direita defensora do Estado mínimo é fã assumida de Paulo Guedes, mas nem ela poupou o ministro da Economia de críticas pesadas depois de sua desastrada declaração da semana passada sobre a alta do dólar.
Ao contrário da maioria das pessoas que se escandalizaram com Guedes, porém, os ultraliberais pouco ligaram para o trecho da fala do ministro em que ele lamenta que empregadas domésticas tenham ido à Disney no passado em razão do dólar barato.
Muito mais importante, para eles, foi a defesa enfática do dólar caro pelo comandante da equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro.
Em um artigo publicado no site do Instituto Mises Brasil na última sexta-feira (14), o economista Anthony Geller pegou pesado. Chamou o ministro de Ciro Guedes, misturando o seu nome ao do ex-candidato a presidente Ciro Gomes (PDT), figura detestada pelos liberais.
Detalhe: Geller, que trabalha no mercado financeira na Inglaterra, é formado pela Universidade de Illinois, bastante influenciada pelo pensamento liberal, assim como sua irmã mais famosa, a Universidade de Chicago, onde Guedes estudou.
“Por uma questão de justiça, Ciro deveria até ganhar algum cargo na área econômica do governo, em homenagem ao fato de algumas de suas ideias estarem sendo desavergonhadamente copiadas”, escreveu o economista, caprichando na ironia.
O pecado de Guedes seria minimizar o câmbio desvalorizado, algo que economistas desenvolvimentistas (e políticos como Ciro) sempre defenderam. O argumento é que o real barato frente o dólar facilita as exportações, o que em tese melhora o balanço de pagamentos e estimula a indústria.
Acontece, diz Geller, que há um duplo efeito perverso nessa política: encarece a importação de máquinas e insumos fundamentais para aumentar a produtividade da indústria e torna mais alto o preço de produtos ao consumidor que dependem de matéria prima estrangeira. Um exemplo que ele cita é o trigo, usado no pãozinho. “Nenhum país jamais prosperou destruindo sua moeda”, afirma ele, que arremata: “Encarecer viagens para a Disney é o menor dos problemas”.
O comentarista conservador Leandro Ruschel foi ainda mais direto ao tratar do assunto. “O que me preocupa na fala do Guedes não é a frase infeliz sobre empregadas domésticas”, tuitou ele na quinta (13). “É a sinalização dada ao mercado sobre querer um real mais fraco. As palavras das autoridades monetárias têm muito peso”, afirmou.
Guedes defendeu o dólar alto em grande medida como um ato de defesa de sua gestão. Afinal, sob seu comando, a moeda americana disparou e atingiu cotação recorde em termos nominais, chegando a R$ 4,33 na semana passada.
Mesmo assim, sua atitude deixou embasbacadas pessoas que o têm como aliado.
Presidente do Instituto Mises Brasil e colunista do jornal Folha de S.Paulo, Helio Beltrão não se segurou ao comentar a declaração do ministro. “O que botaram na bebida do Guedes hoje?”, disse na quarta (12), mesmo dia em que o ministro falou sobre o tema.
Para Beltrão, um dos problemas é o fato de o ministro da Economia se meter numa seara que deveria ser exclusiva do Banco Central, minando a autonomia da instituição. “Ministro da Economia não deve falar de câmbio. Esta é a política de todo país organizado. Se o ministro fala de câmbio, mexe mercados e levanta dúvidas perigosas sobre a autonomia do BC”, escreveu.
Fernando Ulrich, economista-chefe de criptomoedas da XP Investimentos e um libertário assumido (daqueles que questionam a própria necessidade de existência do Estado), escreveu no Twitter que “respeita e admira o ministro Paulo Guedes”, mas vê erros e simplificação no que ele diz.
“Essa política segue pressionando o câmbio, o que não é bom para a economia, a despeito das cotações do Ibovespa”, afirmou ele, em referência aos índices recorde da Bolsa de Valores de São Paulo.
Liberais têm tido uma relação ambivalente com o governo Bolsonaro, relevando algumas de suas investidas mais claras contra instituições em nome do apoio à agenda econômica.
Apesar desse estranhamento de agora, é improvável que rompam com o ministro. Nem a frase sobre as empregadas parece ter causado grande comoção.