Startup baiana promete simplificar a um clique o registro de propriedade intelectual no Brasil
Bahiapor Jamile Amine
Uma startup baiana quer levantar uma discussão sobre processo de proteção e registro de propriedade intelectual no Brasil, para torná-lo mais rápido, digital e diminuir a burocracia. A InspireIP foi criada no início do ano e lançada oficialmente há três semanas por Caroline Nunes, jovem de 27 anos que nasceu em Caruaru (PE), mas por residir em Salvador durante a maior parte da vida e amar a cidade se considera “praticamente uma baiana”.
Advogada, especialista em Propriedade Intelectual e mestra em Propriedade Intelectual e Direitos de Entretenimento pela Universidade do Sudoeste da Califórnia, Caroline começou a elaborar o projeto durante o curso nos Estados Unidos, motivada pelas disciplinas ofertadas e por uma lacuna no mercado nacional.
“Eu peguei várias cadeiras de direitos de música, propriedade intelectual, direitos de videogame, e aprendi como proteger os direitos autorais lá. Eu vi que era uma forma simples, completamente informatizada, e aí eu voltei para o Brasil e quis atuar nessa área, só que quando chegou na parte de direito autoral eu vi que o sistema do Brasil ainda é bastante arcaico. Hoje o único órgão que você faz o registro de forma oficial no Brasil é a Biblioteca Nacional, e você ainda faz usando papel, tem que esperar 180 dias, mandar pelos Correios. Aí eu falei, ‘não tem condição de continuar um sistema assim’”, lembra a jovem, que viu no Blockchain – tecnologia usada por vários países -, uma alternativa para oferecer uma resposta mais rápida e segura.
“O Blockchain funciona como um livro de registros digital e internacional. Então, tudo que você registra nele fica armazenado de forma permanente e de maneira universal. O que você registra em Blockchain você não consegue modificar, ninguém consegue modificar. É um sistema completamente inviolável, e aí ele serve como um mecanismo perfeito para a proteção de propriedade intelectual, principalmente para direitos autorais e segredos comerciais”, explica Caroline, sobre a tecnologia que está por trás do Bitcoin e de quase todas as criptomoedas existentes hoje.
Além da questão da inviolabilidade, que segundo a jovem empreendedora coloca sua startup muito à frente do atual mecanismo de registro no Brasil, ela destaca ainda que a ferramenta possibilita uma proteção que cobre também o processo, e não apenas após a conclusão da obra intelectual. “Por exemplo, a pessoa está inventando alguma coisa, ainda está em fase de projeto, ou ela está escrevendo um livro ou uma letra de música. Hoje ela não tem um mecanismo de proteger isso antes de registrar oficialmente ou antes de lançar de forma definitiva. Ela não tem um mecanismo para poder compartilhar com outras pessoas de forma segura, então foi pra isso também que a gente desenvolveu o sistema”, explica Carline. “Hoje você pode, dentro do sistema, compartilhar seu projeto com terceiros e o sistema tem um termo de confidencialidade integrado. Então, além de você registrar suas ideias e seu projeto em Blockchain, você convida pessoas para participar do projeto com o termo de confidencialidade, o que te garante uma segurança jurídica. Funciona muito mais da forma defensiva. Você tem um livro e quer publicar um e-book, e aí você tem medo de publicar e outras pessoas pegarem, então você registra primeiro pra ter aquela defesa”, detalha.
Veja como funciona o InspireIP:
Outras vantagens de seu projeto, segundo a jovem advogada, são o alcance e a confiabilidade da ferramenta. “Você tem um registro internacional, a linguagem de Blockchain você vai receber um código no certificado e esse código é universal. Então, se você mostra pra uma pessoa da China, da Alemanha, ela vai saber que você é o autor original daquele determinado arquivo, sem precisar traduzir nada, sem precisar passar por todo um trâmite jurídico”, explica Caroline.
Outro ponto forte do projeto apontado por ela é a versatilidade, já que a plataforma pode ser usada para registrar qualquer tipo de propriedade intelectual. “Se você é compositor, escritor, se desenvolve jogos de videogame, se pinta quadros, se é arquiteto ou escreve blogs… Qualquer tipo de direito autoral pode ser protegido por lá e a gente aceita qualquer tipo de arquivo”, garante a empreendedora, que para resumir a função da ferramenta explica que “é uma coisa bastante ampla e serve basicamente como serviço notarial, ao final das contas”. A ampla funcionalidade, inclusive, atraiu campos inesperados à startup. “Eu estou ficando até surpresa porque outros setores, fora da propriedade intelectual, estão vindo procurar a startup, como o da agropecuária”, conta.
Outro ponto importante apontado pela especialista em propriedade intelectual é a simplificação do processo. “Se você gravou um videoclipe ou fez uma gravação no estúdio de uma música que você compôs, na Biblioteca Nacional você não consegue proteger a gravação, porque é em papel. Então, hoje você tem que imprimir a letra, se não tiver a composição tem que mandar fazer e imprimir, tem que preencher um formulário, rubricar todas as folhas, mandar para o endereço deles, esperar bastante tempo, pra ver se eles aprovam o registro lá. Então é uma coisa extremamente burocrática”, avalia Caroline, lembrando que em sua plataforma, com alguns cliques é possível registrar todo tipo de criação, seja lá em qual suporte for, sem precisar lançar mão de estratégias pouco práticas – o processo também leva tempo e é limitado ao suporte papel – como enviar cartas para si mesmos, para comprovar a autoria de determinada obra.
Com pouco tempo de lançada, a startup baiana já abriu algumas portas para a jovem empreendedora. “Conclui o mestrado em março deste ano, e até por causa do projeto da startup, fui aprovada no PHD em Londres, pra pesquisar sobre Blockchain e direito de música. Vou começar em 2021, podia começar no começo do ano, mas empurrei para outubro de 2021 até pra deixar tudo bem estruturado aqui”, conta a jovem, que além do empurrãozinho na área acadêmica, também conquistou apoios importantes no campo profissional. “Eu lancei a plataforma oficialmente há umas três semanas e estou tendo aceitação muito boa no Instagram por parte dos músicos. Eu não esperava isso, mas fui chamada pra um evento grande de música e de lá um cara de uma empresa grande de instrumentos musicais veio falar comigo. A partir desse cara, o organizador da Shark Tank conversou comigo e agora eu vou ser acelerada pela aceleradora deles, que é lá do Mato Grosso do Sul. É uma coisa que está acontecendo atrás da outra, eu não estava esperando isso, mas estou bem feliz”, conta Caroline, empolgada com os próximos passos de seu projeto.