Líderes indígenas relatam ameaças com tiros em áreas demarcadas no Sul da Bahia
Bahiapor Bruno Leite / Leonardo Almeida
Mesmo com toda a repercussão e mortes de diversos indígenas, incluindo de um jovem de 14 anos, as tensões dentro de terras demarcadas no Sul da Bahia não chegaram ao fim. Os povos originários têm relatado frequentemente o recebimento de ameaças, principalmente, de fazendeiros da região. O coordenador do Regional Leste do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Haroldo Heleno, afirmou que, inclusive, a Aldeia Pé do Monte, no Extremo Sul, recebeu um grupo de indígenas na última quarta-feira (14), após novos ataques na região.
Heleno revelou que as tensões entre os povos originários e os fazendeiros do sul se intensificaram no final do mês de julho deste ano. De acordo com ele, os líderes aguardaram por mais de sete anos para a resolução da demarcação das terras, sendo que, segundo o gestor, já existe um relatório que aponta as regiões ocupadas como território indígena.
“Já existe um relatório circunstanciado apresentado. Eles [os indígenas] retomaram algumas áreas dentro deste território já reconhecido no relatório e a partir daí começaram a sofrer uma série de ataques. Tem sido constante, quase todas as noites vem acontecendo ataques com tiros, já se tem muitas denúncias”, relatou Heleno, em entrevista ao Bahia Notícias.
O coordenador da Cimi relembrou o caso de um jovem indígena de 14 anos, Gustavo da Silva, que foi morto a tiros no início deste mês de setembro, no município de Prado, no Extremo Sul baiano (veja mais aqui). Trazendo para um caso ainda mais recente, Heleno citou um grupo de indígenas que chegou na Aldeia Pé do Monte nesta quarta, após sofrer ataques de fazendeiros em sua terra.
“No início de setembro houve o ataque mais violento que vitimou um adolescente de 14 anos, o Gustavo, e um outro ainda saiu ferido por conta desse conflito. Mesmo depois dessa morte os ataques continuam constantes. Na quarta de manhã chegou um grupo grande na Aldeia Pé do Monte oriundo de um ataque na aldeia nova”, afirmou Heleno.
Os caciques relatam que, mesmo com a presença das Polícias Militar e Federal, os ataques não diminuíram na região. O coordenador da Cimi relatou que foram enviados representantes a Brasília para cobrar um maior posicionamento do Governo Federal (veja mais aqui), pois, segundo ele, tanto a presidência da República quanto o Estado da Bahia não têm tomado medidas o suficiente para melhorar a segurança dos indígenas na região.
“Tem uma delegação de Pataxós que foi para Brasília, porque as diversas reivindicações que eles fizeram na região não foram atendidas. Eles já estão pleiteando a possibilidade de uma audiência com a comissão nacional dos Direitos Humanos. Estamos indo justamente pela falta de resposta tanto do governo federal como o da Bahia”, disse o coordenador.
O atual governador Rui Costa (PT) afirmou que as tensões entre fazendeiros e indígenas no Sul da Bahia são responsabilidade do governo federal e que isso consta na legislação. Apesar disso, o chefe do Executivo da Bahia disse que faz o monitoramento dos casos e que vai até o limite “legal” da questão.
“O problema é que a questão indígena é uma questão federal, não é estadual. A gente acompanha, monitora, diria que a gente vai até o limite da linha divisória do que é legal da nossa entrada. Quem devia estar acompanhando, tomando iniciativa para resolver é o governo federal, porque assim manda a legislação”, afirmou Rui Costa.
Além disso, o governador da Bahia também comentou que a responsabilidade pela demarcação de territórios indígenas é do governo de Jair Bolsonaro (PL). Rui também criticou o atual presidente da República e afirmou que ele vem “lavando as mãos” sobre os conflitos em terras indígenas ao redor do Brasil.
“Polêmica de demarcação de terras indígenas não cabe ao governo do Estado, cabe ao governo federal dizer se aquela área é indígena ou não. O governo estadual não tem, legalmente, esse poder. O presidente da República demonstrou todo o seu desprezo pelos indígenas no país inteiro, e esse desprezo da Bahia se traduz em lavar as mãos para os conflitos de área”, disse Rui.
De acordo com a Constituição Federal de 1988, é responsabilidade do Estado brasileiro realizar e assegurar a demarcação de terras indígenas. É da competência da Fundação Nacional do Índio (Funai), que é vinculada ao governo federal, promover essa demarcação. A instituição deve coordenar e executar a política indigenista brasileira, as ações de regularização, monitoramento e fiscalização das terras indígenas.