Ao menos 13 militares da ativa estão na mira da PF pelos ataques do 8/1
Dois generais, nove coronéis, um major e um sargento. Ao menos 13 militares da ativa de patentes altas estão entre os principais nome na mira da Polícia Federal por causa dos ataques aos prédios dos três Poderes em 8 de janeiro.
Os motivos reúnem suspeitas de inércia em relação ao acampamento golpista em frente ao quartel-general do Exército em Brasília, de inação de integrantes da guarda do Palácio do Planalto e de participação direta nos ataques.
Como mostrou a Folha, as investigações da PF devem apontar a participação parcial de militares no 8 de janeiro.
O levantamento da reportagem não leva em conta outros militares que já estão na mira de inquéritos, em especial os relatados por Alexandre de Moraes, do STF, por causa de suas ações ao longo do governo Bolsonaro, nem os de patente mais baixa que desempenhavam funções de segurança nos prédios públicos.
Entre os alvos estão os generais Gustavo Dutra e Carlos Feitosa Rodrigues, o coronéis Wanderli Silva Junior, André Furtado, Paulo Fernandes da Hora, Márcio Resende Júnior, Rodrigo Bragança Silva, Gian Dermario da Silva, Jean Lawand Júnior, Marcelino Carneiro e Mauro Cid, o major José Eduardo Natale e o sargento Luis Marcos dos Reis.
Em todos os casos, um nome é onipresente: o de Cid, ex-chefe da Ajudância e considerado o assessor mais próximo de Bolsonaro.
Cid não só é alvo de várias investigações, entre elas o 8 de janeiro, como arrastou até seu pai, o general da reserva Mauro Lourena Cid, para a mira da PF por causa do episódio da venda de joias presenteadas por autoridades estrangeiras.
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro está preso e, sobre o 8 de janeiro, pesa contra ele tanto o histórico de apoio a Bolsonaro nos ataques contra as urnas eletrônicas como o material encontrado em seu celular relacionado a tratativas sobre um suposto golpe.
Segundo relatório da PF, foi encontrada com Cid uma minuta golpista de um decreto de estado de sítio, além de uma espécie de estudo para a viabilidade para a intervenção das Forças Armadas para reverter o resultado das eleições de 2022. Também foram identificados diálogos sobre um golpe ou manifestações de apoio aos militares.
Companheiro de Cid na Ajudância, o sargento Luis Marcos dos Reis é um dos militares da ativa que participou da invasão a Praça dos Três Poderes. Mensagens encontradas no celular de Cid mostram o próprio Reis comentando a ida ao local dos ataques.
“Entraram no Planalto, no Congresso, ‘Câmera’ dos Deputado e entrou no STF. E quebrou, arrancou as togas lá daqueles ladrões. Arrancou tudo! Foi, foi… O bicho pegou hoje aqui!”, diz o sargento, preso por ordem de Moraes por causa do episódio da falsificação do cartão de vacinação de Bolsonaro.
Além de Reis, os coronéis Márcio Resende Júnior, Rodrigo Bragança Silva, Gian Dermario da Silva, Jean Lawand Júnior e Marcelino Carneiro aparecem em um relatório sobre Mauro Cid. Eles integravam um grupo de militares da ativa com conteúdo golpista.
Lawand Júnior, inclusive, foi chamado para depor na CPI do 8 de janeiro por causa de suas falas.
Ele é o principal interlocutor de Cid nas mensagens destacadas pela PF e insistentemente pede ao então ajudante de ordens para orientar Bolsonaro a dar um golpe contra a democracia: “Convença o 01 a salvar esse país!”, escreveu em uma das conversas.
Um dos dois generais na mira da PF é Gustavo Dutra, à época dos ataques chefe do Comando Militar do Planalto.
Dutra é apontado como responsável por não desmontar o acampamento golpista no QG do Exército em Brasília antes do 8 de janeiro e, também, por barrar a entrada da PM para prender os manifestantes na noite após os ataques.
O próprio Exército admite que há indícios de responsabilidade na atuação de militares ao apontar as falhas do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) na segurança do Palácio do Planalto, como revelou a Folha.
Sem mencionar o nome de possíveis culpados, a conclusão do inquérito policial militar coloca a Secretaria de Segurança e Coordenação Presidencial do GSI no centro das investigações.
À época, a Secretaria era chefiada pelo general Carlos Feitosa Rodrigues. Ele chegou ao cargo na gestão do general bolsonarista Augusto Heleno, em 2021, e assim como boa parte do GSI, foi mantido no governo Lula por Gonçalves Dias, o GDias.
A conclusão cita ainda a sigla DSeg, do Departamento de Segurança Presidencial —que fica diretamente abaixo da Secretaria no organograma do GSI. Em 8 de janeiro, o diretor era o coronel Wanderli Baptista da Silva Junior, hoje na reserva remunerada.
De acordo com o protocolo que define as ações do GSI e do CMP (Comando Militar do Planalto) na defesa do Palácio (chamado de Plano de Operações Escudo), competia ao DSeg demandar o emprego de militares, e buscar informações de inteligência para o planejamento.
No âmbito do DSeg, cabia à CGSI (Coordenação-Geral de Segurança de Instalações) planejar e acionar a tropa do Exército. Desde 2020, a coordenação estava sob comando do coronel André Luiz Garcia Furtado. Às vésperas da invasão, ele previu situação de “normalidade” para o final de semana.
No dia 8 de janeiro, devido à escala de plantão, o major José Eduardo Natale era o coordenador de segurança em serviço. Natale aparece nas imagens do Palácio do Planalto entregando garrafas de água aos golpistas que haviam invadido e depredado o prédio.
A filmagem também mostra o baixo número de homens no palácio e a passividade da tropa —que chegou a cantar o hino nacional com os vândalos. O comandante do chamado BGP, Batalhão da Guarda Presidencial, era o coronel Paulo Jorge Fernandes da Hora.
Em depoimento à CPI da Câmara Legislativa do Distrito Federal, GDias admitiu que manteve no início do governo Lula quase toda a equipe de Bolsonaro —a começar pelo secretário-executivo, o segundo cargo mais alto do ministério.
“Praticamente, senhores e senhoras, eu assumi a equipe antiga, principalmente o secretário-executivo. O secretário-executivo é o grande gestor do ministério. O ministério de segurança [GSI] tem quatro secretarias e um departamento”, disse GDias à CPI do DF em junho.
“Eu ainda acredito na minha instituição, no meu Exército. Nós somos uma organização de Estado, não de governo. E eu sempre acreditei nisso. E, mais uma vez, errado ou não, eu acreditei. Então, o Exército é apolítico. Ele é apartidário. E nós devemos acreditar nisso”, afirmou o general.
A Folha procurou os militares por meio da assessoria de comunicação do Exército. Em nota, a Força disse não comentar apurações de outros órgãos, mas afirmou que “vem acompanhando as diligências realizadas por determinação da Justiça e colaborando com as investigações em curso.”
“Por fim, cabe destacar que o Exército Brasileiro não compactua com eventuais desvios de conduta de quaisquer de seus integrantes.”
Thaísa Oliveira e Fabio Serapião, Folhapress