Eleições de 2020 pautam núcleo político do Planalto

Brasil

Luiz Eduardo Ramos e Jair Bolsonaro

Um novo núcleo de ministros de confiança do presidente Jair Bolsonaro tem trabalhado, a partir do quarto andar do Palácio do Planalto, no planejamento de medidas que antecipam as disputas nas eleições municipais do próximo ano, bem como uma possível campanha à reeleição em 2022.Sem baixar o discurso de polarização, o foco agora passa por ações mais identificadas com a “velha política”, como viagens cada vez mais frequentes a regiões do País hoje administradas pela oposição, participação em programas populares de TV e liberação de mais emendas a prefeituras, em um gesto de aproximação com congressistas.

Segundo ministros, o presidente só espera concluir a reforma da Previdência – já aprovada na Câmara e agora em discussão no Senado – e assegurar a aprovação do nome do filho Eduardo, deputado federal pelo PSL de São Paulo, como embaixador em Washington para movimentar de vez a engrenagem da máquina do governo e percorrer o País. Como exemplo do roteiro que deve ser seguido nos próximos meses, o presidente participou na semana passada de evento em Sobradinho, na Bahia, na segunda viagem ao Estado em menos de um mês. Nos discursos em palanque e também em entrevista ao Estado, Bolsonaro reforçou a ideia de que os governadores da região agem “para dividir o País”, enquanto ele trabalharia para unir. O repasse de dinheiro por meio de emendas cumpriria a tarefa de atrair aliados especialmente nessas cidades do Nordeste, reduto do PT e onde o PSL tem reduzida influência política, e manter a popularidade nos municípios do Sudeste e Sul do País.

Na linha de frente do núcleo político próximo de Bolsonaro estão hoje os ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e Augusto Heleno Ribeiro (Gabinete de Segurança Institucional); o chefe de Gabinete, Pedro César de Souza; o secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten; e ainda o porta-voz, general Rêgo Barros. O grupo se intitula de “núcleo pensante”. Os ministros da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e da Secretaria-Geral, Jorge Oliveira, também são chamados para questões específicas. Oliveira, que passou a cuidar também da área jurídica do governo, é considerado pessoa de extrema confiança de Bolsonaro e, desde o início da sua gestão, tem a prerrogativa de despachar sozinho com o presidente. Ele esta à frente do setor que analisa os projetos dos ministérios e dá parecer a decisões do presidente.

Já a entrada do general quatro estrelas Luiz Eduardo Ramos, velho amigo de Bolsonaro do tempo da caserna, no lugar do três estrelas Carlos Alberto Santos Cruz – demitido em junho depois de divergências com as estratégias da equipe de comunicação – teve o efeito de esfriar eventuais críticas das Forças Armadas à saída de um militar. Na hierarquia do Palácio, Ramos tem o controle da Secretaria de Comunicação, que está nas mãos de Wajngarten. O publicitário já colocou o presidente nos estúdios de programas populares de TV, como Sílvio Santos e Ratinho.

As grandes mudanças na base política de Bolsonaro ocorrem em paralelo a medidas consideradas cirúrgicas. Na semana passada, o governo afastou Márcia Amorim da Secretaria Especial de Modernização do Estado – controlada por Oliveira. Márcia é ligada ao ex-ministro Gustavo Bebianno, exonerado da Secretaria-Geral da Presidência depois de entrar em atrito com Bolsonaro e seu filho, Carlos.

A nova configuração do “núcleo duro” do governo tem chancelado o discurso do presidente com ataques a setores dos direitos humanos (como colocar em dúvida dados oficiais sobre a morte de desaparecidos políticos durante o regime militar), meio ambiente e imprensa. Nos encontros, Bolsonaro e seus auxiliares repetem a todo momento que existiria uma “guerra” em curso, com uma tentativa crescente de atingir a imagem pessoal do presidente e “destruir” seu governo, seus ministros e familiares.

Segundo o relato de um colaborador do presidente, Bolsonaro disse na semana passada que “de guerra” ele entende, tem “treinamento” e sabe “como combater inimigo”. Por isso, pretende manter um discurso que investe na polarização. Um interlocutor do Planalto disse que uma das “armas” de Bolsonaro contra a imprensa – considerada “inimiga” – foi a medida provisória que acaba com a obrigatoriedade de publicação de balanços em jornais de grande circulação. A ideia foi discutida e aprovada entre os integrantes do núcleo político.

O governo federal já liberou R$ 450 milhões em emendas a municípios de janeiro a julho deste ano, valor que supera o desembolso registrado nos últimos três anos. O deputado Herculano Passos (MDB-SP),vice-líder do governo na Câmara e presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Municípios, afirmou que a agilidade do governo em liberar emendas se deve ao empenho da articulação política do Planalto e à “boa vontade” dos ministérios em realizar os pagamentos. “O governo está pagando mais as emendas e mais rápido”, disse. “Isso é bom para todo mundo. Para a população, porque os serviços são prestados, para o prefeito, que passa por dificuldade, e para o parlamentar. Tenho emenda de 2015 esperando.”

A oposição discorda da avaliação e vê interesse eleitoral no movimento do governo. “Existe a percepção de que há uma tentativa do governo de criar condições de disputa eleitoral no ano que vem a partir da utilização desses instrumentos”, disse o senador Humberto Costa (PE), líder do PT no Senado. “Da parte dos governadores, especialmente no Nordeste, de oposição, não existe esse fluxo tão fácil de liberação dos recursos.” Levantamento feito pelo Estadão/Broadcast mostrou que a Caixa Econômica Federal reduziu a concessão de novos empréstimos para o Nordeste. Em 2019, até julho, o banco autorizou novos financiamentos no valor de R$ 4 bilhões para governadores e prefeitos de todo o País. Para o Nordeste, foram fechadas menos de dez operações, que juntas totalizam R$ 89 milhões, ou cerca de 2,2% do total – volume muito menor do que em anos anteriores.

Estadão

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