TCU absolve servidores por crédito do BNDES para obras no exterior, e Mercadante comemora
BrasilO TCU (Tribunal de Contas da União) arquivou, nesta terça-feira (5), três processos que analisaram as condutas de gestores do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) em financiamentos para obras em outros países. Apesar disso, orientou a instituição a não repetir falhas no crédito à exportação.
O primeiro caso avaliou operações de financiamento de exportações de serviços de engenharia para obras rodoviárias entre 2005 a 2014. Prevaleceu o voto do ministro Vital do Rêgo, que considerou que as falhas verificadas não configuram dolo ou erro grosseiro passíveis de punição aos gestores do banco.
O tribunal acatou as justificativas apresentadas por gestores, ex-gestores e colaboradores do banco, dos níveis estratégico, tático e operacional. Por causa disso, eles não foram multados nem inabilitados para exercer cargos em comissão ou funções de confiança na administração pública federal.
O TCU analisou a regularidade de 67 operações de crédito realizadas pelo BNDES, sendo 56 operações em Angola, oito na República Dominicana, uma em Gana, uma a Guatemala e umaem Honduras.
Foram avaliadas supostas irregularidades relacionadas à concessão de financiamentos com inclusão de “gastos locais”, ou seja, gastos realizados no país destinatário da exportação ou de outras despesas que não se caracterizam como exportação de bens e serviços brasileiros —o que seria considerado desvio de finalidade.
Para o ministro Vital do Rêgo, não houve pagamento de gastos locais das obras com os recursos da exportação de serviços de engenharia, acrescentando que isso foi atestado por declarações dos próprios países importadores.
O caso teve relatoria do ministro substituto Augusto Sherman, que foi voto vencido no caso. Ele concluiu que quase metade dos recursos concedidos tiveram desvio de finalidade e pediu a aplicação de R$ 864 mil em multas a 36 ex-diretores e ex-dirigentes da área de comércio exterior do banco.
O ministro avaliou que o desvio de finalidade na linha de crédito pode ter sido de R$ 22 bilhões, sendo R$ 5 bilhões nos financiamentos para obras rodoviárias no exterior. As falhas, segundo Sherman, começaram na análise dos pedidos de crédito e seguiram até o efetivo desembolso dos recursos.
O ministro disse, no relatório, ver indícios de favorecimento direto a países e indireto a empreiteiras brasileiras. “Tais falhas e irregularidades podem ter viabilizado a celebração de contratos que, de outra forma, não seriam economicamente ou financeiramente viáveis para os referidos países”, escreveu.
O segundo processo foi instaurado para examinar possíveis irregularidades ocorridas na Camex (Câmara de Comércio Exterior da Presidência da República), no Cofig (Comitê de Financiamento e Garantia das Exportações) e na Secretaria do Tesouro Nacional.
Os ministros analisaram a aprovação de um pagamento do prêmio de seguro de crédito à exportação sem a devida indicação dos fundamentos jurídicos. As operações analisadas envolveram diversas obras de infraestrutura entre as quais a Autopista Nacional e Porto de Mariel, ambos em Cuba, e a Barragem de Moamba Major, em Moçambique.
Foi aprovada pelo TCU recomendação para que o banco estabeleça que os postulantes aos financiamentos apresentem mais elementos para o crédito, como documentos previamente aprovados pelo país importador, como o estudo de viabilidade técnico e econômico-financeiro do empreendimento ou do projeto.
O TCU toma a decisão no momento em que o governo articula a volta do financiamento de obras tocadas por empresas brasileiras em países estrangeiros, interrompido desde 2016 após as investigações da Operação Lava Jato. No ano passado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enviou projeto de lei ao Congresso para retomar esse tipo de operação.
Segundo o diretor jurídico do BNDES, Walter Baère, o julgamento foi um primeiro passo para um arcabouço jurídico mais forte. “Vamos aguardar a aprovação do projeto de lei que tramita no Congresso e sua regulamentação para recomeçarmos com financiamentos”, disse Baère ao Painel S.A..
O executivo do banco avalia que essa retomada é importante para a economia. “No ápice dessas operações, o BNDES chegou a financiar exportações de serviços de 1.400 empresas brasileiras”, disse. “Eram serviços de engenharia de ponta. Isso estimulou uma indústria nacional de máquinas pesadas.”
De acordo com informações do BNDES, foram desembolsados US$ 10,5 bilhões entre 1998 e 2017 para exportação de serviços ao exterior. Deste total, 89% foram em favor de seis países: Angola (US$ 3,2 bilhões), Argentina (US$ 2 bilhões), Venezuela (US$ 1,5 bilhão), República Dominicana (US$ 1,2 bilhão), Equador (US$ 0,7 bilhão) e Cuba (US$ 0,65 bilhão).
O Brasil sofreu calote de Venezuela (no valor de US$ 763 milhões), Moçambique (US$ 122 milhões) e Cuba (US$ 284 milhões), em um valor total de US$ 1,17 bilhão acumulado até dezembro de 2023. Outros US$ 458 milhões desses países estão por vencer.
Em nota após a decisão, o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, disse que “a relação colaborativa com o TCU tem sido fundamental para a retomada do BNDES como grande instrumento de fomento ao desenvolvimento nacional, como comprovam os dados do nosso balanço anual de 2023”.
“O TCU, na presidência do ministro Bruno Dantas, já havia contribuído decisivamente para essa retomada ao parcelar a restituição dos empréstimos do BNDES ao Tesouro Nacional, o que permitiu reconstituir o caixa do Banco para alavancar o crédito”, disse.
Para Mercadante, o TCU reforça a segurança jurídica sobre essas operações e joga luz sobre um tema que é alvo de ampla campanha difamatória. “Além disso, propõe medidas que contribuem para a ampliação da transparência e da qualidade desses programas”, afirmou.
Ele acrescentou que o BNDES não apoia obras estrangeiras ou projetos em outros países e que em nenhuma modalidade oferecida pelo banco há envio de recursos para o exterior.
“A atuação do BNDES no financiamento à exportação de bens e serviços se dá exclusivamente para empresas brasileiras, gerando emprego e renda no Brasil. Ademais, todas as operações são resguardadas por garantias do Fundo de Garantia à Exportação (FGE), que só recebeu recursos públicos quando da sua constituição”, disse.