Congresso turbina emendas para 2024 e pode ter controle de quase R$ 50 bilhões

Brasil

O parecer de Forte diz que o Orçamento deve reservar pelo menos 0,9% da RCL (receita corrente líquida) de 2022 para programações indicadas por comissões permanentes do Congresso. Dois terços do valor serão designados pelos colegiados da Câmara dos Deputados, e o restante, pelas comissões do Senado.

Além disso, o relator previu que, em caso de frustração de receitas, as emendas de comissão só poderão ser bloqueadas na mesma proporção do corte aplicado sobre as despesas não obrigatórias do Poder Executivo.

As emendas de comissão não são impositivas como as indicações individuais ou de bancada estadual. Carimbar um valor mínimo na LDO e limitar o contingenciamento para esses recursos é uma forma de protegê-los contra cortes ou remanejamentos. Na prática, trata-se de uma blindagem.

Técnicos ouvidos pela Folha lembram que a impositividade das emendas individuais e de bancada, garantida por diferentes emendas constitucionais aprovadas a partir de 2015, teve origem em dispositivo semelhante incluído na LDO de 2014.

Hoje, a Constituição reserva 2% da RCL para emendas individuais e 1% para emendas de bancada estadual.

A ideia, segundo líderes do Congresso, é que as emendas de comissão preencham o lugar deixado pelas extintas emendas de relator, principal moeda de troca nas negociações políticas entre o governo Jair Bolsonaro (PL) e os parlamentares.

As emendas de relator foram extintas pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que declarou sua inconstitucionalidade há cerca de um ano.

Ao turbinar as emendas de comissão, os integrantes da cúpula da Câmara e do Senado passam a ter poder sobre essa verba bilionária e podem dividir o montante com base em critérios políticos.

Articuladores políticos do Palácio do Planalto temem que esse novo modelo crie um descontrole e rachas internos no Congresso, já que a disputa por cargos de comando nas comissões tende a se ampliar.

Esse é outro fator que fortalece as cúpulas das duas Casas, pois o acordo de divisão das comissões entre os partidos é costurado pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O plano dos líderes do Congresso é que as emendas de comissão não sejam repartidas igualmente entre cada colegiado. Segundo pessoas envolvidas nas negociações ouvidas pela Folha, comissões como de infraestrutura, de saúde e de educação vão receber fatias maiores do que outras.

O Congresso chegou a discutir até mesmo um novo tipo de emenda (as de liderança), mas acabou optando por turbinar as de comissão, que já existem desde o governo Bolsonaro. No entanto, até 2022, essas emendas eram inferiores a R$ 1 bilhão por ano.

Desde 2023, com o fim das emendas de relator, os parlamentares passaram a ampliar o uso das emendas de comissão.

Pelo texto da LDO, as indicações das emendas de comissão em 2024 terão início cinco dias após a publicação do Orçamento, por meio de ofício encaminhado diretamente aos ministérios, órgãos e unidades responsáveis pela execução das despesas.

Após a indicação, os ministérios terão até 90 dias para divulgar os programas e ações contemplados, bem como informar a necessidade de ajustes técnicos pelos autores. Ao fim desse prazo, o governo terá mais 30 dias para empenhar a despesa —o empenho é a primeira fase do gasto, em que o governo se compromete com a contratação do bem ou serviço.

No caso de transferências automáticas e regulares a serem feitas pela União a estados e municípios, o texto ainda obriga o governo a “realizar o pagamento integral até 30 de junho de 2024”.


ENTENDA AS EMENDAS PARLAMENTARES E SEU USO
O que são emendas?
Emenda é a forma que deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar o capital político

Quais os tipos de emendas?
Hoje existem três tipos: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região) e as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso)

VEJA A CRONOLOGIA DAS EMENDAS PARLAMENTARES
Antes de 2015

A execução das emendas parlamentares era uma decisão política do governo, que poderia ignorar a destinação apresentada pelos congressistas.
2015

A emenda constitucional 86/2015 estabeleceu a execução obrigatória das emendas individuais, o chamado orçamento impositivo, com algumas regras.
2019

O Congresso ampliou o orçamento impositivo ao aprovar a emenda constitucional 100, que tornou obrigatórias também as emendas de bancadas estaduais
O Congresso emplacou um valor expressivo para as emendas feitas pelo relator-geral do Orçamento, R$ 30 bilhões para o ano seguinte
Jair Bolsonaro vetou a medida e o Congresso só não derrubou o veto mediante acordo que manteve R$ 20 bilhões nas mãos do relator-geral
Bolsonaro também deu uma autonomia completa para a cúpula do Congresso decidir para onde todo esse montante seria destinado
2020

Com o acordo de 2019, feito por Bolsonaro para manter uma base de apoio no Congresso, o valor destinado às emendas deu um salto e chegou a R$ 44 bilhões.
2022

Durante a campanha eleitoral, Lula criticou o modelo de negociação com o Congresso e prometeu sepultá-lo, mas, na prática, acabou não fazendo isso
O STF (Supremo Tribunal Federal) declarou inconstitucional a emenda de relator. A verba foi rebatizada e transferida ao orçamento dos ministérios, mas o governo Lula driblou a decisão e manteve o uso político dos recursos —há, em 2023, R$ 9,8 bilhões reservados para esse tipo de negociação
2023

Cada deputado teve R$ 32 milhões em emendas individuais (senadores, R$ 59 milhões), valores que têm execução obrigatória e que em alguns casos podem mais que dobrar em decorrência das emendas de bancadas e das “emendas extras”

 

Idiana Tomazelli e Thiago Resende/Folhapress

Deixe sua avaliação!

Mais Notícias de Brasil