Estudo mostra desproporção entre população e número de médicos

Brasil

Médicos chegam ao local de prova para a segunda etapa do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por Instituição de Educação Superior Estrangeira (Revalida) 2020, em Brasília.

Estudo feito pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e a Associação Médica Brasileira (AMB) mostra que há desproporção entre o crescimento da população e o número de médicos, além de má distribuição regional de profissionais, concentração em poucas capitais, e distribuição insuficiente e desigual de especialistas.

Segundo a atualização do estudo Demografia Médica no Brasil 2023, tendo como base dados do Censo de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há 1,58 médico especialista por 1.000 habitantes, considerando profissionais titulados em pelo menos uma das 55 especialidades médicas reconhecidas e a população.

Em todas as especialidades existe desigualdade de distribuição entre os estados, mas algumas estão concentradas em poucos estados, como é o caso de cirurgiões. No Pará, por exemplo, são 0,46 por 100 mil habitantes, seis vezes menos do que no Distrito Federal (60,84).

O número de anestesiologistas no Maranhão (4,40 por 100 mil) é cinco vezes menor do que no Rio de Janeiro (22,54 por 100 mil). A média nacional de Medicina de Família e Comunidade, uma das especialidades nos serviços de Atenção Primária, é de apenas 5,54 para 100 mil habitantes, sendo que 15 estados estão abaixo dela.

De acordo com o coordenador do estudo e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), Mário Scheffer, consideramos os 545 mil médicos no Brasil, mas desses, 192.6 mil, quase 38%, são aqueles que não têm especialidade médica, os chamados generalistas. “São médicos que concluem a graduação e não se tornam especialistas. Assim, os demais 321,5 mil médicos são especialistas, e essa distribuição é mais concentrada e mais desigual do que entre os médicos em geral”.

Scheffer destacou que ao analisar a evolução nacional da taxa de estudantes de medicina por 1.000 habitantes, comparada à taxa de médicos cursando residência médica (RM) por 1.000 habitantes, percebe-se a defasagem entre a oferta do ensino de graduação (1,05 estudante por 1.000 habitantes em 2021) e a oferta da formação especializada (0,21 médico residente por 1.000 habitantes). A RM é a principal modalidade para formar especialistas.

Segundo os dados, de 2015 a 2023 houve aumento de 57% na oferta de vagas de residência médica no Brasil, passando de 29.696 para 46.610 vagas, mas a disponibilidade de vagas de primeiro ano de residência não tem sido suficiente para acompanhar o aumento do número de médicos graduados.

“Esse é dado importante, porque alerta para o fato de que, enquanto temos um aumento muito grande de estudantes de medicina, devido à abertura de cursos e vagas de medicina, temos um certo congelamento da capacidade do país de formar especialistas via residência médica.”

Alerta
O professor ressaltou ainda que surgem duas questões: a má distribuição dos especialistas e o alerta para o futuro, pois caso o ritmo se mantenha, com abertura de escolas de medicina sem o aumento da especialização, em curto prazo haverá também a falta de especialistas.

“Temos assistido o envelhecimento da população e maior demanda por médicos especialistas. A população com mais de 60 anos será de mais de 36 milhões de pessoas em 2025, segundo o IBGE e, com isso, teremos aumento das doenças crônicas não transmissíveis que as maiores causas de adoecimento e morte.”

Além disso, ele lembrou que duas políticas de saúde pública recentes, do governo federal, também demandam maior número de especialistas, como o Programa Nacional de Redução das Filas de Cirurgias Eletivas, Exames Complementares e Consultas Especializadas (PNRF) e política de Atenção Primária à Saúde. “

Levantamento
O estudo mostra aque o Brasil tem 545.7671 médicos para um total de 203.062.512 habitantes. A razão, portanto, é de 2,69 profissionais de medicina por 1.000 cidadãos. De acordo com o IBGE, a população brasileira cresceu 291%, de 51,9 milhões de habitantes em 1950 para 203 milhões em 2022. No mesmo período, o número de médicos saltou de 22,7 mil para 545,7 mil, o que representa um crescimento de 2.301%. Segundo os dados, 70% de médicos estão concentrados onde vivem menos de 30% da população.

No intervalo entre os dois censos mais recentes, o crescimento da população brasileira desacelerou em relação a contagens anteriores, aumentando 6,5%, um acréscimo de 12,3 milhões de habitantes em 12 anos. Já a população de médicos, no mesmo período, cresceu 70,3%, um aumento de 225.290 profissionais em 12 anos. O crescimento está relacionado à grande abertura de cursos e vagas de graduação em medicina.

De acordo com o levantamento, quando considerados os 2,69 médicos por 1.000 habitantes no país, duas regiões estão abaixo da média nacional: o Norte, com 1,65, e o Nordeste, com 2,09. O Sudeste tem a maior densidade médica (3,62), seguido de Centro-Oeste (3,28) e da região Sul (3,12). E ainda é possível notar que, enquanto o Distrito Federal tem seis médicos por 1.000 habitantes, o Maranhão tem apenas um.

O levantamento aponta ainda que a desigualdade na distribuição de médicos no Brasil fica ainda mais evidente no agrupamento de municípios, segundo estratos populacionais e com base no Censo 2022 do IBGE. Entre os 5.570 municípios do país, 3.861 (69,3%) têm até 20 mil habitantes. Juntas, essas cidades têm cerca de 31,9 milhões de habitantes ou 15,8% da população brasileira. Nesse mesmo conjunto estão apenas 16,7 mil médicos, ou 2,8% do total de profissionais do país. Inversamente, nas 41 cidades com mais de 500 mil habitantes, onde vivem 29% da população nacional, estão concentrados 61,5% dos médicos. As 319 cidades com mais de 100 mil habitantes concentram 57% dos habitantes e 85,5% dos médicos do país.

Nove capitais – Salvador, Natal, Belém, Porto Alegre, Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Vitória e Fortaleza) – tiveram retração populacional nos últimos 12 anos, segundo o Censo 2022. Nas demais capitais, a população aumentou, com os maiores crescimentos registrados em Palmas, Florianópolis, Cuiabá, João Pessoa e Manaus. Assim, houve alterações na taxa de médicos por habitantes em relação à edição anterior do estudo Demografia Médica no Brasil. Florianópolis registra quase dois médicos por 1.000 habitantes a menos. A taxa também diminuiu em Cuiabá e São Luiz.

Vitória, que já era a capital brasileira com maior densidade médica, tem agora 18,14 médicos por 1.000 habitantes, um acréscimo de 3,65 após o ajuste populacional.

A capital do Espírito Santo é seguida por Porto Alegre, Florianópolis, Belo Horizonte e Recife, todas com mais de oito profissionais por 1.000 habitantes. No outro extremo das capitais, com menos de três médicos por 1.000 habitantes, estão Macapá (2,21), Boa Vista (2,68) e Manaus (2,77).

 

Agência Brasil

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