PCC que hoje mira Moro já planejou morte de chefe da PF e ataques ao estilo Farc
O plano para atacar autoridades, entre elas o ex-ministro e atual senador Sergio Moro (União Brasil-PR), é mais um engendrado pela cúpula do PCC como retaliação às investidas do poder público para reprimir os crimes cometidos pela facção criminosa.
Chefes da facção criminosa aparecem em investigações da Polícia Federal há anos tramando desde a morte e sequestro de servidores públicos, como delegados federais, agentes e diretores do sistema penitenciário federal, até explosão de prédios públicos e torres de transmissão, no modelo de atuação copiado das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).
Apareceram nessas investigações nome de autoridades que seriam alvos como o promotor Lincoln Gakiya, investigador do PCC em São Paulo, e o ex-coordenador de repressão a entorpecentes e facções da PF, delegado Elvis Secco.
Assim como no caso mais recente envolvendo Moro, os integrantes do PCC miram as autoridades, principalmente, por causa das condições do sistema penitenciário federal, considerado muito mais rígido do que os estaduais.
Boa parte da cúpula da facção, entre eles Marcos Willians Herbas Camacho (o Marcola), foi transferida para penitenciárias federais em 2019. Antes disso, outros nomes proeminentes do grupo já estavam nos presídios e tramavam formas de retaliar as autoridades.
No caso da operação para barrar o ataque contra Moro, as transferências das lideranças durante sua gestão na Justiça e a manutenção de regras mais rígidas nos presídios federais, como a proibição das visitas íntimas, são apontados como motivos para o ex-juiz ter entrado na lista da facção.
Moro foi responsável por uma portaria que manteve as regras rígidas no sistema federal publicada no mesmo dia da transferência de integrantes da cúpula do PCC para presídios federais, em fevereiro de 2019.
A apuração sobre os planos do PCC começou no Ministério Público de São Paulo e, a partir de janeiro, teve a participação da PF. A corporação já tinha outras linhas de investigação sobre planejamentos de ataques do PCC, alguns descobertos em uma operação em 2022 sobre o plano de fuga de Marcola e outras lideranças.
Os planos, na maioria das vezes, foram descobertos a partir conversas —por celular, bilhete ou no parlatório— interceptadas pelo setor de inteligência do Depen (Departamento Penitenciário Nacional) ou pelos investigadores da PF.
Ainda em 2018, informações coletadas por esses órgãos expuseram dois planos da facção engendrados no presídio federal de Porto Velho (RO) para realizar atentados contra agentes públicos e explodir a sede do próprio Depen, em Brasília.
Os investigadores descobriram que o modelo de ação havia sido definido por uma das principais lideranças do PCC à época, chamada Abel Pacheco (o Vida Loka), após conversa com Luis Fernando da Costa (o Fernandinho Beira-Mar), liderança do Comando Vermelho. Os dois haviam cumprido pena juntos na penitenciária federal de Mossoró (RN).
A PF chegou a interceptar a conversa dos dois em que o Beira-Mar apontava para o sequestro de autoridades e pessoas “importantes”, assim como a explosão de torres de transmissão, como forma de barganhar pela soltura de lideranças.
A ideia tem inspiração na guerrilha colombiana Farc. “A guerrilha foi, pegou umas autoridades, três ou quatro, aí falou: ó, dou tantos dias pá liberar; se não der, rápt! Rapaz, pegou o primeiro”, disse Beira-Mar ao integrante do PCC.
Além do plano de explodir a sede do Depen, a investigação também mostrou como já em 2017 a proibição das visitas íntimas nos presídios federais era um dos motivos do planejamento de ataques.
“Deixamos claro, independente de liberar a íntima (visita), ao nosso ver o projeto deve ser colocado mesmo assim em prática, pois o propósito será quebrar todas as principais opressões”, dizia um bilhete encontrado no esgoto do presídio em Porto Velho.
Segundo a PF, o projeto citado por Abel Pacheco era sequestrar, torturar e assassinar agentes públicos para pressionar o governo a liberar as visitas íntimas.
Em 2021, novos bilhetes apreendidos pelos investigadores sinalizaram a intenção do PCC em atentar contra autoridades.
Durante uma revista em uma cela da Penitenciária de Presidente Venceslau, no interior de São Paulo, onde várias lideranças do PCC ainda estão presas, foi encontrada uma lista de autoridades que seriam alvo do grupo.
Entre elas, o promotor Linconl Gakiya, o delegado Elvis Secco e outros investigadores da PF. No total, a lista tem 14 nomes.
Secco foi o responsável pela prisão de Luiz Carlos da Rocha, o Cabeça Branca, apontado como um dos maiores traficantes da América Latina.
Também durante a gestão de Secco na coordenação de combate ao tráfico, a PF prendeu Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho. O traficante é visto como aliado de Marcola e atuava para o PCC em países produtores de droga.
Um relatório de inteligência do Depen de 2022 mostra como Fuminho teria ordenado a morte do delegado.
“A ordem para a execução de Elvis Secco teria partido do preso Gilberto Aparecido dos Santos (Fuminho), simpatizante do PCC e atualmente recluso na Penitenciária Federal em Catanduvas –PR, pois este teria conhecimento, à época em que se encontrava em liberdade, de que o delegado Seco o investigava”, diz trecho do relatório.
Procurado, o delegado não quis se manifestar.
Em 2022, uma outra operação da PF mirou diretamente Marcola, liderança máxima do PCC. Ele estaria envolvido em um plano de fuga e ataque a servidores do Depen.
A investida contra os servidores públicos recebeu o apelido de STJ nas conversas interceptadas pela PF e mirava o sequestro de diretores do Depen para posterior troca pela liberdade das lideranças da facção.
Nesse caso específico, segundo a PF, o objetivo seria trocar a liberação dos servidores pela liberdade de um integrante da facção apelidado de Ciro —os investigadores apontam que Ciro seria Marcola.
Fabio Serapião/Folhapress