Em carta aberta à Secult, artistas e produtores questionam Editais Setoriais
Bahiapor Jamile Amine
Em uma carta aberta à Secretaria de Cultura da Bahia (Secult), artistas, proponentes e produtores culturais apontam problemas nos Editais Setoriais 2019 e questionam o modelo das políticas publicas do governo estadual para o setor.
Após apontar a “inegável relevância” do Fundo de Cultura da Bahia (FCBA) e do lançamento dos editais, a carta expõe a decepção com o incentivo cultural previsto para este ano. “O lançamento dos editais Setoriais em 2019 foi recebido com grande entusiasmo pela classe artística por possibilitar o financiamento de projetos que alavancam a cultura no estado da Bahia. Contudo, de antemão, observamos a diminuição no investimento financeiro, de quase 40 milhões de reais em 2016 para uma previsão de 15 milhões em 2019. E mais grave que isso, vemos com preocupação a difusão de um pensamento técnico-burocrata na SecultBA, que vai de encontro ao próprio princípio e objetivo da política cultural na Bahia, que visa a ‘democratização, descentralização e desburocratização no incentivo à pesquisa, à criação, à produção e à fruição de bens e serviços culturais’”, destaca o documento assinado por centenas de pessoas.
Na carta, o grupo lembra dos problemas enfrentados pelos proponentes do Edital Setorial do Audiovisual 2019 e afirma que a Secult comete os mesmos erros. “A SecultBA volta a aplicar os mesmos critérios discricionários na avaliação, primeiramente, da habilitação das propostas e depois dos recursos de diversos projetos desabilitados, mais de 550 propostas, na fase de Avaliação Prévia”, diz o texto, pontuando que como a chamada pública anterior, “diversos projetos inscritos nos Editais Setoriais 2019 foram inabilitados na fase de Análise Prévia por motivos diversos, entre eles por arquivo corrompido e ausência de detalhes formais em documentos ou currículos secundários”.
Os signatários do documento dizem ainda estarem “inconformados” com a situação por terem esperado para que os editais voltassem a ser publicados, e ao final terem se deparado com “uma gestão inflexível e visivelmente despreparada para lidar com as especificidades do campo cultural”. “Consideramos a publicação do resultado dos recursos nesta sexta-feira, 13 de dezembro de 2019, como alarmante: foram recebidos pela SecultBA 577 recursos, mas apenas 10 deles foram deferidos. Este número revela o descompasso entre a SecultBA e boa parte da classe artística do estado”, avaliam os produtores e artistas, que apontaram diversos problemas técnicos no Clique Fomento – ferramenta utilizada pelo governo para que as propostas sejam submetidas -, que teria corrompido diversos arquivos.
“Vale ressaltar que boa parte dos recursos se amparou no previsto no item 7.2 do Edital: ‘Durante a análise prévia, sendo constatado equívoco ou omissão meramente formal e havendo previsão no Anexo II, poderá ser concedido prazo para correção pelo proponente, não sendo permitidos ajustes de itens fundamentais que alterem as características da proposta’. Estranha saber que alguns poucos projetos receberam notificações para tais correções e ajustes – inclusive para inclusão de documentos obrigatórios, enquanto a maioria só soube desses equívocos após o resultado da não-inscrição, ato que fere por completo o princípio da isonomia previsto para a seleção pública”, questionam, afirmando ainda que tais fatores demonstram que “os mecanismos de seleção da SecultBA vão contra os princípios da política cultural e tampouco se ampara no edital, que possui um texto pouco claro, ou na legislação”, já que, segundo eles, o texto do edital é ambíguo, o que induz ao erro, e que o processo não respeita princípios como o art. 3º da Administração Pública, que dão conta dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
“Não queremos acreditar que a Secretaria de Cultura do Estado da Bahia prefere excluir uma porcentagem imensa de projetos com potencial qualidade e relevância por conta de ajustes formais tão fáceis de ser resolvidos ou por equívocos de natureza interna do sistema – e o preferem talvez para que não haja tanto trabalho e investimento na análise de mérito de centenas de projetos”, dizem os artistas no documento. “Não queremos acreditar que a burocracia seja mais importante do que o dever de dar suporte à cultura do Estado da Bahia e que esta prática de exclusão seja a nova maneira de gerir os mecanismos de fomento e incentivo promovidos pela Secretaria de Cultura”, acrescentam, destacando que a carta é “um sinal de boa fé”, na busca pelo diálogo, mas pontuando que não têm a “intenção de nos deixar vencer por um processo que consideramos injusto e que estamos a postos, reunidos e articulados, para encaminhar providências legais junto ao Ministério Público e outras instâncias que nos possam dar suporte neste momento”.