Congresso manobra para carimbar fundão eleitoral e evitar novo desgaste em 2020

Brasil

Além de inflar os recursos do fundo eleitoral para R$ 3,8 bilhões, congressistas manobram para deixar carimbado já neste ano a totalidade da verba pública para a campanha e evitar pendências que provocariam um novo desgaste político em 2020.

O projeto de Orçamento apresentado pelo presidente Jair Bolsonaro, que previa inicialmente um fundo de R$ 2 bilhões, não assegura integralmente os recursos para a eleição do próximo ano. O Congresso precisaria aprovar um projeto de lei até junho para liberar R$ 1,3 bilhão desse valor.

Congressistas, porém, não querem passar por uma nova votação em ano eleitoral relacionada ao financiamento de campanha. O problema de uma nova votação, na avaliação de líderes partidários, é colocar nos holofotes novamente um tema espinhoso —dinheiro público para financiar disputas eleitorais.

A operação-abafa consiste em esgotar esse assunto neste mês, para não deixar sob risco a liberação de nenhuma parcela dos R$ 3,8 bilhões.

A manobra envolve uma mudança no Orçamento para que outra despesa, que não seja financiamento eleitoral, dependa do aval do Congresso. Isso blindaria todos os recursos do fundo, mas deixaria outros tipos de despesas, como aposentadorias, dependentes dessa nova aprovação.

A Folha mostrou nesta quinta-feira (5) que a proposta do fundo aprovado em relatório preliminar prevê retirar dinheiro de educação, saúde e infraestrutura.

Ao colocar os recursos para campanhas na lista de despesas que necessitam de uma nova votação em 2020, o governo queria assegurar que o Congresso autorizasse Bolsonaro a descumprir a chamada regra de ouro, que proíbe o Executivo de se endividar para pagar despesas correntes, como salários e aposentadorias.

Estão condicionados R$ 361 bilhões a um novo aval do Congresso, e apenas R$ 1,3 bilhão se refere ao fundo.

Líderes partidários que encabeçam a articulação pelo aumento do financiamento público de campanha discutem retirar o fundo desse grupo de gastos.

Assim, a liberação dos recursos para a campanha estaria garantida no próximo dia 17 de dezembro, quando está marcada a sessão do Congresso que vai votar o Orçamento de 2020.

Partidos que representam a maioria das cadeiras da Câmara e do Senado articularam a alteração no projeto de Orçamento para elevar o valor do fundo de R$ 2 bilhões para R$ 3,8 bilhões.

O fundo inflado, com recursos de áreas sociais, foi aprovado na quarta-feira (4) pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso. O relatório preliminar foi elaborado pelo deputado Domingos Neto (PSD-CE).

O projeto passará por uma votação final na comissão e, logo em seguida, no plenário do Congresso —onde pode ser aprovado com maioria simples.

O aumento do fundo eleitoral uniu rivais como PSL e PT, além de ter sido respaldado por partidos do chamado centrão —grupo de partidos independentes do governo e que representa a maioria da Câmara.

Foram 13 legendas que endossaram o montante bilionário, que representam 4 em 5 parlamentares do Congresso: PP, MDB, PTB, PT, PSL, PL, PSD, PSB, Republicanos, PSDB, PDT, DEM e Solidariedade. Esses partidos somam 430 dos 513 deputados e 62 dos 81 senadores.

Em documento enviado a Neto, o grupo pedia que o orçamento fosse de R$ 4 bilhões. Nas eleições de 2018, o fundo foi irrigado com R$ 1,7 bilhão.

O argumento da classe política é que, no pleito para prefeitos e vereadores, o número de candidatos é maior.

Os recursos do fundo são distribuídos de acordo com regras estabelecidas pela legislação eleitoral. Um dos critérios é o número de cadeiras na Câmara e no Senado. As maiores bancadas –PSL e PT– são as mais beneficiadas.

Neto, relator do Orçamento, nega a retirada de dinheiro da saúde, educação e infraestrutura para a ampliação do fundo. Ele afirma que os recursos virão de R$ 7 bilhões de receita adicional, incluída por ele mesmo no parecer preliminar. Diz que a origem do dinheiro é uma reestimativa de arrecadação em razão de dividendos de estatais, proveniente de lucros das empresas públicas.

No entanto, houve também corte de R$ 1,7 bilhão em diversos ministérios para 2020. O deputado alega que a medida foi para atender as emendas dele mesmo e das bancadas. Os recursos, porém, não são carimbados, ou seja, não têm uma destinação específica e saem todos do caixa da União.

Do corte inteiro, as áreas mais afetadas foram: saúde (R$ 500 milhões), infraestrutura e desenvolvimento regional (R$ 380 milhões), que inclui obras de habitação e saneamento. A redução em educação chegou a R$ 280 milhões.

Líderes do centrão já calculam que aos menos 328 deputados e cerca de 40 senadores apoiam a ampliação do fundo.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é crítico ao aumento do valor. Mesmo assim, aliados afirmam que ele não deve entrar em confronto com a maioria da Casa.

No mesmo dia em que a comissão aprovou a elevação de recursos para as campanhas, Maia sustentou que a medida precisa ser explicada à população.

“Nas democracias, as eleições precisam ser financiadas, e o financiamento privado está vedado. É preciso construir no financiamento público, mas tem que se verificar o valor e de onde virá o recurso para que a sociedade compreenda com o mínimo de desgaste possível para o Congresso”, disse Maia.

Folha de S.Paulo

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