Bolsonaro e filhos agora acenam ao RS após menosprezo a pandemia e a chuvas na Bahia
Jair Bolsonaro (PL) e seus filhos Eduardo e Flávio têm utilizado a tragédia no Rio Grande do Sul para criticar o governo Lula (PT) e enaltecer a gestão do ex-presidente até mesmo na atuação frente à Covid-19.
Na narrativa reconstruída pelo clã, são ignoradas as reiteradas vezes em que Bolsonaro agiu com menosprezo a outras tragédias, incluindo a pandemia.
“Lula foi no RS ficou por três horas e foi embora; Lula ri durante coletiva de imprensa sobre tragédia no RS”, diz o começo de um post do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) da semana passada em que critica o atual governo.
No final de 2021, durante a intensificação das chuvas na Bahia, Bolsonaro foi passar férias em Santa Catarina.
No dia 27, em passeio pela praia, Bolsonaro declarou que esperava “não ter de retornar antes” do feriado de Réveillon. Na véspera, o número de municípios em situação de emergência no estado subiu de 25 para 72.
Dois dias depois de ser visto andando de jet ski e em meio às enchentes na Bahia, Bolsonaro fez ainda uma visita ao parque Beto Carrero World em SC.
Para driblar as críticas, o ex-presidente e aliados citam uma viagem feita em 12 de dezembro daquele ano, quando uma primeira sequência de chuvas assolou diversos pontos do estado. A partir do dia 23 daquele mês, entretanto, as chuvas voltaram a castigar a Bahia.
À época, para amenizar as críticas, o governo federal montou uma força-tarefa para divulgar as respostas de Bolsonaro à tragédia. Um anúncio de liberação de verba, no entanto, gerou confusão. Isso porque a indicação é de que haveria abertura de crédito de R$ 200 milhões apenas para o estado —o valor era, na verdade, para reconstrução de rodovias em cinco estados, entre eles a Bahia.
Em 31 de dezembro, Bolsonaro assinou medida provisória para liberar R$ 700 milhões ao Ministério da Cidadania e atender áreas atingidas pelas chuvas.
“Irresponsável, cruel, desumano…”, escreveu ainda Flávio Bolsonaro sobre a recusa do governo Lula quanto a itens oferecidos pelo governo uruguaio para o Rio Grande do Sul, conforme revelado pela Folha.
Em 2021, em meio à piora da situação na Bahia, Bolsonaro dispensou apoio oferecido pela Argentina, justificando que a ajuda não seria necessária naquele momento e indicando que poderia até mesmo atrapalhar.
Na época, em tom de ironia, Bolsonaro disse ainda que os países da América do Sul que quisessem ajudar poderiam se prontificar a receber venezuelanos. “Quem quiser colaborar nesse sentido aí é só entrar em contato com o nosso embaixador aí”, afirmou na ocasião.
Agora, em meio às chuvas no Rio Grande do Sul, Lula usou entrevista para fustigar o antecessor, dizendo que ele estava passeando em um jet ski durante as enchentes na Bahia e que não se preocupou.
Em seu perfil, Bolsonaro publicou texto e vídeo do senador Rogério Marinho (PL-RN) fazendo referência ao episódio, dizendo que “Lula politiza tragédia no RS”.
“Em um momento de urgente união nacional pelo bem do Rio Grande do Sul e do povo gaúcho, o presidente Lula insiste em fomentar a polarização. Infelizmente, o PT faz política com o desastre e a tragédia que enluta o país”, diz o texto republicado pelo ex-presidente.
Ao longo de seu governo, Bolsonaro politizou uma série de episódios. Na visita que fez à Bahia ainda na primeira fase de chuvas que atingiram o estado, o então presidente aproveitou entrevista coletiva em Porto Seguro para criticar o então governador da Bahia, o petista Rui Costa.
“Também tivemos uma catástrofe no ano passado, quando muitos governadores, o pessoal da Bahia, fechou todo o comércio e obrigou o povo a ficar em casa. O povo, em grande parte, informais condenados a morrer de fome dentro de casa”, afirmou.
“Alguns me falam com tristeza ‘poxa Eduardo, Presidente @jairbolsonaro deu azar pegando uma pandemia’”, escreveu o deputado federal Eduardo Bolsonaro, nesta segunda-feira (13) em rede social. “Vendo a resposta do Lula agora no caso do RS eu penso: demos foi é sorte! Imagina o que seria do Brasil e dos brasileiros com Lula presidindo-o na pandemia!”
Ao longo da pandemia da Covid-19, Bolsonaro promoveu aglomerações, desrespeitou medidas sanitárias, divulgou e adquiriu medicamentos sem eficácia contra a Covid e propagou afirmações falsas sobre as vacinas.
Ele questionou políticas de distanciamento social e elegeu governadores, prefeitos e o STF (Supremo Tribunal Federal) como inimigos. Bolsonaro usou ainda palavras como “histeria” e “fantasia” para classificar a reação da população e da mídia à doença.
No mesmo dia em que o Brasil ultrapassava a marca de 10 mil mortos pela Covid-19, Bolsonaro fez um passeio de jet ski no Lago Paranoá, em Brasília. Horas antes ele afirmava em redes sociais que era falso o convite para um churrasco no Palácio da Alvorada que ele mesmo havia anunciado. Em meio ao passeio aquático do então presidente, Judiciário e Legislativo decretaram luto.
Em março de 2021, segundo pesquisa Datafolha, 54% reprovavam o desempenho do governo na pandemia, enquanto apenas 22% o viam como ótimo ou bom.
Àquela altura, o Brasil atingia recordes diários de mortos pela Covid-19, a rede hospitalar estava colapsando em vários estados e os mortos pela doença no país passavam dos 260 mil.
“Nós temos que enfrentar os nossos problemas, chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando? Temos de enfrentar os problemas”, disse Bolsonaro no início de março, um dia depois de o Brasil ter registrado 1.840 pela doença em 24 horas. “Respeitar, obviamente, os mais idosos, aqueles que têm doenças, comorbidades, mas onde vai parar o Brasil se nós pararmos?”, completou.
“Eu não sou coveiro”, respondeu Bolsonaro, ainda no começo da pandemia, em abril de 2020, ao ser questionado sobre qual seria o número de mortes que ele julgava aceitável para defender medidas como abertura de escolas e comércio.
Bolsonaro encerrou seu mandato com pouco de mais de 693 mil mortes pela doença.
DESDÉM DE BOLSONARO EM TRAGÉDIAS DURANTE MANDATO
Chuvas na Bahia
Bolsonaro tirou férias no litoral de SC em 2021 enquanto a Bahia enfrentava crise gerada por fortes chuvas, andou de jet ski e disse que esperou “não ter de retornar antes”
Negacionismo
O ex-presidente desrespeitou medidas sanitárias, divulgou e adquiriu medicamentos sem eficácia contra a Covid-19 e propagou desinformação sobre as vacinas
‘Não sou coveiro’
Questionado em 2020 sobre um número de mortes que ele julgava aceitável para defender a abertura de escolas e comércio, Bolsonaro respondeu que não era coveiro
Mimimi
À época em que Brasil vinha atingindo recordes diários de mortos pela Covid, Bolsonaro disse: “Nós temos que enfrentar os nossos problemas, chega de frescura e de mimimi. Vão ficar chorando até quando?”
Renata Galf/Folhapress